quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Clandestinagem - Uma crônica sobre a pluralidade que encontrei em você


Eu te pedi e você veio, e devagarzinho vai deixando a sua marca em mim. Como uma brisa que bate no rosto num fim de tarde caloroso que, aconchegante, refresca e acolhe. Lembro dos seus olhos se levantarem e se arregalarem quando se encontraram com os meus, e eu pensava em jogar o meu cigarro antes que você me visse, mas não deu tempo, porque você já estava na mesa do bar de esquina soltando a fumaça do cigarro teu. Logo já estávamos íntimos, dividindo a cerveja e o friozinho que aquele dia chuvoso nos trouxe. Você parecia acanhado sendo que eu esperava uma persona mais escrachada, e isso me fez te apreciar mais naquele momento. Quando demos as nossas primeiras risadas foi quando percebi que poderia ser eu mesma, e tenho sido, sob a segurança de que você não me julgar por isso. Eu gosto do som da sua risada e quando seu rosto forma um sorriso sereno e doce que me contagia e me faz ser mais divertida, é como se você despertasse o melhor de mim. Cada vez mais você foi se infiltrando na minha vida e, sem que eu pudesse perceber, você já estava em mim, e isso me assustou. Me deixou confusa porque eu nunca tive a oportunidade de ter vivido o que vivo contigo hoje, e por mais que eu desejasse isso há anos, eu fiquei sem saber como agir. Eu sinto que eu posso ser livre com você, apenas não compreendo até que ponto essa liberdade funcionará para nós. Talvez eu ache que sei o que quero, mas eu não sei o que você quer, no entanto acredito que podemos descobrir isso juntos. Você estaria disposto? Eu amo a sua leveza e as gargalhadas que só você conseguiu me arrancar nas manhãs em que eu geralmente estou sob efeito de um mau humor doentio. Eu me sinto transbordar quando estou contigo, não sei explicar o que realmente é isso, mas eu apenas sei que é algo lindo que eu nunca havia sentido. É diferente daquelas paixões arrebatadoras e incontroláveis, em que você passa o dia todo enjoado à espera de algum sinal do ser amado, quando toca o telefone e você sai correndo para ver se é a pessoa e morre um pouco por dentro quando nota que se trata de outra. Quando você vive sob uma pressão angustiante entre picos de euforia e extrema depressão porque se entope de expectativas tão opressivas, que seu corpo se torna incapaz de se livrar das toxinas e sintomas narcóticos. Ou quando desperta em você um sentimento de caos onde a única fonte de paz se encontra no ser superestimado e praticamente irreal. Não, ainda bem que não é assim conosco. Você me faz sentir alguém melhor, assim como dizem nesses textos de auto-ajuda que lotam nossas time-lines e que as pessoas mais possessivas e intolerantes insistem em compartilhar como se estivessem aprendendo algo de tanto que se fixam em informações que, interiormente, não passam de palavras enfiadas goela abaixo e serão esquecidas no primeiro sinal de estímulo a um comportamento de ciume. Exatamente como as pessoas que oram diante de um padre ou pastor todas as semanas, e dormem enquanto os mesmos leem algum trecho de um livro grosso e antigo. Elas pensam que estão fazendo algum bem para o mundo e para si mesmas, quando na verdade a maioria se engana. Nosso romance é mais do que um romance, aliás, vai muito além. Eu te vejo como um cúmplice de uma vida clandestina e libertina em uma cidade caótica e tão louca quanto nós. Sinto que você não veio para me confundir e sim para me estender a mão, não para me ajudar, mas para caminhar ao meu lado por onde essa estrada puder nos levar. E enquanto não soubermos, nós iremos nos embriagar, cair no chão com dor de estômago de tanto rir de nossas próprias tolices e, levemente, provocando no outro qualquer sensação intensa e insana até descobrir se isso realmente é amor ou alguma outra coisa que não existe no nosso vocabulário. Obrigada.

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