quinta-feira, 24 de abril de 2014

Para dizer que não falei das flores - Uma ode à vida e morte dos sentimentos que parecem eternos

Acho que nasci numa sociedade moderna demais para gostar das flores. Talvez seja uma herança dos meus pais, eles gostam das flores. Aliás, eles vão mais além: gostam de plantar as sementinhas, regar a terra todos os dias e, quando os primeiros botões surgem, já é um motivo de alegria. Eu apenas gosto de observá-las. Não por muito tempo, beirando o autismo, mas por algum presságio, enquanto dura algum sentimento.

Eu gosto das flores. Eu gosto das cores. Eu gosto dos odores que elas exalam. Cada uma de uma forma particular. Algumas são mais perfumadas, outras só cheiram a mato e raiz. E cada uma tem seu tempo de vida, de cor e aroma. Cada uma tem sua beleza. Assim como as pessoas, ou algumas delas. 

Essa sociedade que cito no começo do texto é a mesma que deseja uma bateria eterna para seus smartphones, que aprecia a vaidade da posse. Não é possível possuir uma flor, assim como não é possível possuir o que não se pode ter. Essa sociedade que preza pelos adornos ora inquebráveis, ora descartáveis, é a mesma que se ilude com a premissa de amor eterno e sofre, calada, com a falta de aconchego, com a carência crônica. A mesma que sobrevive em meio ao concreto extenso e não vê árvores da janela de seus apartamentos.

Mas quem sou eu para criticar? Logo eu, tão insensata e impulsiva? Logo eu, que já fiz promessas de amor eterno e, acreditei, por alguns momentos, que só se amava uma vez na vida?

Pois é. Foi o que meu ex passou a acreditar depois de pouco mais de um mês longe. Que só se ama uma vez na vida. Ledo engano, eu diria.

Não se ama só uma vez na vida. Amor não é esse sentimento superestimado e inalcançável que as pessoas tanto insistem em desacreditar ou acreditar demasiadamente. É possível se amar quantas vezes tiver que acontecer, e só é verdadeiro e bom quando as duas pessoas estiverem dispostas a isso. A vida não é como nos livros ou filmes. A vida é o agora, e o presente momento é onde é possível sim, amar e ser amado uma, duas ou duzentas vezes.

É preciso viver para entender, mas não é preciso sofrer para saber o que não é bom para você. Parafraseio Criolo, parafraseio Geraldo Vandré, parafraseio Vinícius e Chico, parafraseio o eu que não cala, o eu que precisa falar. As flores que ele me deu murcharam e sim, tiveram prazo de vida, assim como tudo ao nosso redor, assim como o amor que senti por ele.

E que venham novas cores, aromas e amores. Novas experiências, amizades e lugares. Novos gostos, cheiros e abraços. E que tudo na vida seja como flores: eternas enquanto durem. 

terça-feira, 15 de abril de 2014

Que delícia é...

Que delícia é sentir-se livre, leve e solta. Não digo isso pela solteirice, mas pelo desprendimento do que nos fez mal. Chegar em casa, abrir uma lata de cerveja, dar risada de qualquer merda e tomar aquele banho delicioso que você ansiou o dia todo.

Que delícia é sentir aquela brisa gostosa de fim da tarde batendo no rosto, depois de um longo expdiente, sabendo que suas obrigações naquele dia acabaram.

Que delícia é sentir-se desapegada de questões materiais, de lembranças vergonhosas e de sentimentos banais. Sentir-se livre de todo mal, como se você fosse um super herói ou um deus grego, forte e inabalável.

Que delícia é conhecer novas cores, novos sabores, sons e sensações. E mais delícia ainda é saber que ainda tem muito por vir e que a sua ânsia pelo novo não atrapalha o valor que você dá para o que tem agora.

Que delícia é saber que você pode ser quem você quiser e não precisa se importar com os julgamentos, porque você está suficientemente estável para superá-los, ou não escutá-los.

Que delícia é entender que a vida passa devagar, mas que ela é comum e só é bela se você deixar, se você quiser.

Que delícia é saber que o que foi ruim passou e não ocupa mais espaço algum dentro de você e ter noção do quanto isso te fez evoluir emocionalmente.

Que delícia é não ter planos concretos de longo prazo, nem para amanhã e mesmo assim não estar incomodado com a incerteza.

Que delícia é aproveitar cada dia como único, como intangível, mas ao mesmo tempo maleável, porque você faz dele o que quiser, de acordo com o que acontecer. É saber que você tem opções, basta seguir as que fizerem mais sentido.

Que delícia é não sentir sua alma comprometida e aprisionada. Ser livre, assim como veio ao mundo.

Que delícia é viver. Que delícia!

Leveza - Uma crônica sobre como o incerto e a paciência podem nos tornar mais leves

The Kills - Last Day of Magic

A pressa de viver sempre fez de mim uma pessoa descuidada, vaidosa, impulsiva e imprevisível. Sempre me entediou tudo que parecesse morno: beijos sem paixão, abraços sem calor, conversas sem gargalhadas, sorrisos forçados, sexo sem gosto, sem gozo, e assim por diante. E parece que a vida assim, inconstante, é mais interessante. Parece que assim você vive intensamente. Parece, apenas parece. No entanto, viver sob à corda bamba, por mais fascinante que pareça, não funciona na prática. Pelo menos, não para uma pessoa como eu estava acostumada a ser.

A ânsia nos faz apressar os fatos e estragar o que nem se iniciou. Hoje eu sei o que as pessoas impulsivas procuram: estabilidade. Viver o incerto é perigoso e, se arriscar, cansa. Porque dá trabalho, porque na verdade o que eu desejava era estar tranquila com algo nas mãos, pois a incerteza me confunde, me deixa louca. E, nessa loucura, a perda da sanidade e o descontrole caminham juntos. E, é nesse instante que se torna muito fácil confundir desejo com ansiedade.

Meu lema sempre foi me jogar de cabeça em tudo. E a vontade de vivenciar qualquer coisa logo era o que supria a minha determinação em continuar fazendo tal coisa. Mas certas coisas perdem o sentido com o tempo, com o que acontece ao redor, com a aproximação de outras pessoas e com o próprio desejo, que muda.

No entanto, hoje, eu aprendo. E levo comigo lições que, antes, eu não achava que importassem. Hoje eu procuro a calma em vez da posse. E a única estabilidade que venho conquistando é a emocional. Essa é a diferença entre querer muito algo e fazer de tudo para que aconteça logo, para assim sentir-se estabilizado temporariamente, até que outra vontade surja e todo círculo vicioso se reinicia. É um vício eterno.

E quando eu iria aprender a lidar com todas essas emoções, desejos e aflições? Quando eu aprendesse que nada na vida vem fácil, ao menos, o que realmente vale a pena. Não é preciso apressar o que pode acontecer e, sim, é possível aprender muito com tudo isso.

Vou mais além e volto a repetir que viver o incerto pode sim ser gostoso, contanto que você viva e não permaneça estático. É possível viver intensamente e ter cuidado, até porque, o cuidado te fará viver melhor depois e tão leve quanto uma pena que vaga pelos ares, sem rumo, sem planos. É difícil esperar? Sim, mas é necessário e, com o tempo, essa "espera" se torna prazerosa. 


Osho:
"Não tente achar um atalho, porque não há atalhos. O mundo é uma luta, é árduo, é uma tarefa penosa, mas é assim que a pessoa chega ao pico."

"Uma vez que você abandone as expectativas, você aprendeu a viver."

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Entre afasias e heresias - Uma crônica sobre a falha humana de insistir na sobrevivência

Amarga é a vida daqueles que se acomodam em afagos gelados e sem sentido. Daqueles que convivem com dilemas pessoais e não conseguem determinar uma decisão, ou uma razão. Daqueles que estão presos aos sentimentos do passado e não encontram caminhos em direção ao ensolarado horizonte. Daqueles que vagam pelas ruas vazias da solidão em busca de corpos apenas para satisfazerem suas necessidades - que são mais vazias que suas almas. Daqueles que vivem em confusão, a todo momento, e já não compreendem o prazer impagável da brisa do vento, batendo no rosto num fim de tarde ou a satisfação de receber um sorriso verdadeiro e contagiante ao acaso.

Que necessidade é essa de se prender a feitos, que apenas resistem (leia-se: insistem) por meio de um rótulo ou determinada regra e, que há muito tempo, foram desfeitos? Que morreram a partir da primeira mentira contada, da primeira mágoa, da primeira decepção. E perderam o sentido quando o próprio sentimento se calou. E vagou.

E qual seria o ponto de equilíbrio ideal para viver substancialmente bem consigo mesmo? O que é preciso para se sentir completo?

"É preciso coragem", é o que ouvi e li de algumas bocas fundamentalmente sábias e em persuasivos textos de auto-ajuda. E sim, talvez uma dose de bravura seja crucial para abandonar o que é visto como "certo" e prosseguir para o incerto. E, talvez isso funcione, sabe? Basta não se levar tão a sério, encarar o que vier com leveza e, caso o coração acelere e a ansiedade queira sair pela garganta, vá a um quarto escuro ou num campo aberto e grite. Extravase todas as dores e chore desgovernadamente se houver necessidade, mas quando decidir que é a hora de voltar, retorne lindamente e com a cabeça erguida, nem virada para o céu, nem para o chão, mas na altura dos olhos alheios. E olhe nos olhos, cumprimente o porteiro, o faxineiro, o zelador, aperte as mãos de outrem com firmeza, abrace com vontade e prossiga serenamente como se pudesse flutuar.

E a vida segue assim. Irrefutável, imprevisível e, ainda bem, interessante. Não como uma roleta russa, não como uma sequência de devaneios e atos impensados, ou um mártir de longos arrependimentos.

Apenas pense: amanhã pode ser o último dia. Então, vamos viver?

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Cheiros

Os copos estão vazios. Não porque secaram, mas porque daquela última garrafa de rum, não sobrara uma gota. E o cheiro amargo das bitucas de cigarro impregnava no ar, nas roupas e nos fios de cabelos. Nos lençóis e nas toalhas, ainda molhadas do banho de uma hora atrás. E os corpos, nus, entrelaçados, adormeciam, enquanto expiravam e inalavam ambos os odores.

Para F.