quarta-feira, 29 de abril de 2015

O fim

Hoje tento compreender este fim repentino que quebrou todos os nossos planos. Nossa viagem no meu aniversário, o almoço com meus pais no domingo, a visita à casa de sua avó no natal, a nossa ida sozinhos à praia assim que recebêssemos, os pequenos desejos que criamos em conjunto e poderíamos colocar em prática no decorrer do ano, da vida, o fim de semana sem dinheiro em que passaríamos enrolados no edredom, nos aquecendo com o calor de nossos corpos. Como eu vou esquecer cada um desses planos que minha mente construiu junto à sua ao longo desses 4 meses, assim, de repente? É como pegar um saco cheio de papéis coloridos, amassá-los e queimá-los até perderem sua cor, sentido e definição.
Mas a vida tem que seguir, assim como os planos, certo? Planos que podem ser reciclados, arrumados e totalmente renovados. Nisso, o tempo e uma dose de coragem ajudam. Mas, e o meu amor, onde fica? Eu não sei o tamanho dele - nem sei se é possível medi-lo -, mas pequeno, não é. Não sei se vou descobrir a profundidade dele durante esse tempo longe de você, mas definitivamente, eu não queria passar por isso, é muita dor. Eu não queria desistir de nós, não queria refazer os meus planos, não queria te ver como um estranho, que esteve tão presente na minha vida e que agora está tão distante.
Minha casa mantém seu cheiro, é como se você estivesse ali o tempo inteiro. E está, porque você faz parte de toda a história que eu tive nela. Desde arranjar os entregadores, ao desencaixotar de caixas, à primeira refeição, ao primeiro drink, à primeira compra, ao primeiro passeio pela vizinhança, ao descobrimento dos comércios locais, ao boteco da frente que foi cenário para conversas sérias e para a primeira noite na minha rua, ao seu lado. Eu ainda não te conhecia bem e você as vezes parecia nervoso, mas sempre gentil e afável, sempre convidativo, sempre incrível, em tudo. Eu temia muitas coisas, mas você sempre me deixou segura para ser eu mesma, e eu fui ficando e você entrando cada vez mais na minha rotina, nos meus desejos, na minha vida.
Te tirar assim, bruscamente, é um abuso dos mais graves a tudo que eu tenho como mais essencial no meu caráter e no meu emocional. É arrancar uma parte imensa de mim e da trajetória que iniciei este ano. Entretanto, eu não sei se é preciso. Eu não quero te esquecer à força, me esquivar da lembrança sua a cada momento que eu ver, sentir ou tocar algo que te remeta. E daí eu entendi que eu não quero te esquecer. Eu não quero te amar menos, e nem quero tirar qualquer vestígio de você de mim. Mesmo que seus pensamentos e desejos agora sejam completamente contrários aos meus, mesmo que hoje você tente me ignorar na sua mente e no seu coração, mesmo que você esteja tentando me odiar. Não me importa. Eu não quero te tirar de mim.
Eu não quero esquecer da maneira doce que você ri, com a boca fechadinha e repleta de graça. Da voz grave que sai desses lábios carnudos e doces que fizeram eu me perder tantas vezes. Do olhar confuso e penetrante desses olhos fundos e radiantes. Do toque da sua pele macia e rígida, que contempla esse corpo forte. Dos seus braços aconchegantes que me pegavam no colo e me transportavam para outra dimensão. Do seu delicioso pênis, que se encaixava direitinho em mim e me proporcionaram inúmeros momentos de prazer e loucura. Da forma como você me possuía e me despertava os desejos mais impuros. Da sua companhia insubstituível, seja nos dias cinzas, seja na hora da alegria. Do seu bom humor repleto de ironia e da maneira simples que você encara a vida. Do seu jeito tão único, que se desmembra entre o menino sonhador e alegre, ao homem preocupado e responsável e ao garoto que ama super heróis e coleciona bonecos repletos de valor sentimental, que aludem sua infância e o seu desenvolvimento pessoal.
Eu sinto que jamais poderei esquecer aquela viagem na praia, que vimos a lua vermelha, fizemos planos com os pés na areia e nos amamos como nunca, sedentos pela carne do outro e com o peito cheio de amor. Em que você nos salvou de três trombadinhas, tão pequenos perante ao enorme homem que os enfrentava, com uma coragem e senso de proteção imbatíveis. Da noite na Roosevelt, em que me declarei à você no dia em que decidimos voltar e compreendemos, ali mesmo, que nosso futuro estava apenas começando - será que fomos ingênuos demais em acreditarmos que nosso amor salvaria as mazelas que trouxemos para o nosso relacionamento? Eu sentia que podia flutuar, mas melhor que isso: que poderia fazer isso de mãos dadas a você sem qualquer medo de cair. Não porque te via como uma muleta emocional, mas porque eu criei confiança em você e sentia que éramos parceiros de crime, cúmplices do acaso e da rotina e amantes que se amavam e cuidavam um do outro. Também não tenho como esquecer da vez que apareci no meio da noite na sua casa, de táxi, durante a semana, e você me arrancou do carro e não conseguia me soltar mais. Nem da vez em que te levei para o banheiro do bar, enquanto batiam na porta loucamente e ríamos sem parar, com você, todo sem jeito. Do seu último dia de trabalho em que te visitei antes de fechar, e estreamos aquele lugar. Das vezes em que, sem dinheiro, trouxemos o bar para a nossa casa, e bebemos, fumamos e cozinhamos petiscos, enquanto planejávamos o que faríamos quando estivéssemos com grana, não porque estivesse ruim daquele jeito, mas porque ambos queríamos melhorar o momento com o outro. Não esqueceria também das vezes que você me socorreu, no dentista, no hospital, nas quedas na rua, nas escadas, no trampo, quando eu não aguentava mais e saber que ao te encontrar ao fim do dia, tudo ficaria melhor. Dos rangos quando não tive forças para cozinhar, das vezes em que me perdi e você me doou seu abraço para me confortar, e das inúmeras massagens para me fazer relaxar. Das bebedeiras, em que já pudemos cuidar um do outro. Das vezes em que, naturalmente, proferimos elogios enquanto nos pegávamos nos encarando, como se o sentimento de amor nos dominasse por completo.
Chorei muito ao relembrar cada momento até chegar até aqui, mas eu decidi não lamentar mais pelo fim. Eu fui sincera, poderia ter agido de outras maneiras, poderia ter uma máquina do tempo e desfazer vários erros, mas a vida é agora, e no momento, eu fui sincera comigo mesma e não tenho como voltar atrás. Decidi que, por te amar demais, eu tenho que te deixar partir e também devo seguir o meu caminho. Mesmo sabendo que o que estamos fazendo vai contra o que queremos, mesmo sabendo que o tempo pode ser crucial para nunca mais te ter na minha vida, e que poderemos nos perder para sempre um do outro. Eu não quero falsas esperanças, então compreendi que vou ter que lidar com a sua rejeição. Que em alguns dias, vou chorar menos e terei aceitado melhor a sua ausência. E que ainda terei muitos demônios para enfrentar, especialmente longe de você. Esses dias foram essenciais para o meu crescimento, mas ainda me restam muitos - assim espero. E talvez, quem sabe, um dia nos encontremos pelas esquinas da vida, e estejamos mais maduros e dispostos a nos amar com plenitude, a sermos o que queríamos ter sido um para o outro e talvez estejamos prontos para o relacionamento que ambos queríamos. Não para enfrentar os dias frios, esquentar nossa cama vazia ou solucionar nossa solidão, mas porque, se for amor de verdade, então nosso fim só aconteceu por um cálculo errado de timing. Não tão errado assim, porque confesso: foi um verdadeiro prazer te conhecer. Se cuide e saiba que sempre torcerei por você. Vá e voe, nenão.