segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

 Hoje, pela primeira vez, de forma completamente devastadora, senti o peso da idade. Senti que não posso mais sonhar. Que o tempo estava se esgotando para mim. Portanto, não posso me dar ao luxo de criar planos mirabolantes que vão me salvar da minha realidade. Hábito que cultivo desde a infância. Senti vontade de correr, sair, escapar. Mas, não de um jeito que reflete covardia através da fuga. De um jeito que me vi sendo espremida e me soltar seria me libertar dessas correntes. Uma sensação pesada demais, confusa, que faz as sobrancelhas arquearem involuntariamente e a boca serrar e os olhos paralisarem. Não ter controle é uma morte terrível. Acho que estou muito cansada. 


sábado, 28 de novembro de 2020

Finados

 Não vou dizer que cheguei ao limite, porque estou há tanto tempo me sentindo pressionada de tantas maneiras, que não sei mais quando foram ultrapassadas minhas próprias barreiras. Só percebo a materialização dessa dor quando ela se transforma em hematomas, que colorem o meu corpo com disfuncionalidades, aflições súbitas e um inflacionado desespero que me faz querer correr sem saber pra onde. E, então, me paralisa, me fazendo questionar se existe algum lugar. Aonde eu caiba confortavelmente. Aonde não hajam circunstâncias que tentem me tirar à força repetidamente. E tudo isso, que dura meses, não passa de um sofrimento silencioso, verbalizado inúmeras vezes, mas silenciado. Deste modo, sigo enfrentando os dias, esperando que eles terminem logo, enquanto negligencio parte de mim, parte do meu ser. Às vezes me pego flertando com o nada, como se fosse possível extrair algo dali. Como se houvesse além no vazio. E me esvazio, cavando esperanças em água mole. Me agonizo, ao ponto de que nem as metáforas me agradam mais, são expurgadas e muitas vezes sem forma. Gostaria de concretude, não me vislumbra a poética aonde não enxergo mais poesia. Ainda desejo muito além de sobrevida. Ainda desejo. Mas, não me vejo forte, pois estou exausta. Pedindo socorro ou, no mínimo, calmaria. Aonde o silêncio seja escolha e não regra para calar nosso âmago. E, a partir disso, talvez eu consiga me levantar. Talvez consiga enxergar amenidade onde tudo é turbulento. Talvez a água não se torne gelo, talvez ela flua como num rio aonde não se entra duas vezes. Talvez se for para findar, que seja o que não me atenua, não a minha própria existência. 

domingo, 2 de agosto de 2020

Letargia

Queria abrir os olhos e acordar deste pesadelo
Queria que tudo isso não passasse de uma ilusão
Que as pessoas pudessem voltar a sorrir e se abraçar
Que eu voltasse a sorrir

Queria que, apesar de tudo, o mundo fosse justo
Queria que a vida fosse um direito de todas e todos
Que as pessoas pudessem sonhar e conquistar
Que eu voltasse a sonhar

Queria que a esperança continuasse presente
Queria que fosse questão de tempo para dias melhores
Que as pessoas apenas tivessem paciência e perseverança
Que eu tivesse esperança

Queria que ninguém se sentisse aprisionado
Queria que eu não me sentisse como se não fosse sobreviver
Que as pessoas pudessem acreditar que o amanhã há de ser melhor
Que eu eu pudesse acreditar

Queria não ter que brigar e suplicar por cuidado
Queria que o ódio não fosse combustível da conversa\
Que ele fosse cuidadoso e se importasse
Que eu ainda me importasse

Queria tantas coisas, mas ao mesmo tempo, apenas queria não sentir nada. Queria esta dor acabasse antes que eu tivesse coragem de tentar acabar com ela com as minhas próprias mãos. Que eu não flertasse com a ideia de morrer antes de saber se existe vida ainda.

quarta-feira, 1 de julho de 2020

Eu pra mim é pouco

Neste corpo que me compreende, não me encontro

Adquiri um peso que meus ombros não podem carregar

Os dias passam como meses, e eu não os percebo

Oscilo entre manhãs nubladas e tempestades noturnas

Sem meio termo, com o copo meio vazio

Temo que este recipiente não irá suportar mais

Noto que dias ensolarados borraram na memória

Restando um gosto amargo que arde o estômago

E traz o invólucro a tona, febril e oco

Não reconheço o reflexo, como se me fosse tomado

O corpo não é meu, nem do Estado, é de outrem

Não o controlo, mas sinto todas as suas dores

Gostaria de não sentir, mas não cabe mais a mim escolher

Queria ser universo, mas mal caibo numa agulha

Sou nada, invisível e alienígena

Fui muito, intangível e insaciável

Fui

Sou

Quero

Ainda

Eu pra mim é pouco.

quarta-feira, 13 de maio de 2020

Não vamos sobreviver a esta pandemia

Por muito tempo reclamei da sensação de abandono sabendo que não se tratava apenas de algo que eu sentia involuntariamente. Pois sabia que sua falta de tato jamais seria resolvida com uma massagem de 5 minutos sobre a ferida já aberta. Hoje, um ano, quase dois anos depois, volto a sentir com mais intensidade as marcas sangrarem. Assim como o sentimento de infelicidade se renovou. Te odeio. Por me fazer lembrar do que meu pai já causou em minha mãe. Por ver você reproduzindo comportamentos muito parecidos, mesmo sendo de gerações diferentes, tendo vidas diferentes. Mas meu pai não consigo odiar, pelo menos não sem o sentimento de culpa acompanhado. Ele é meu pai e não o escolhi, mas já vivemos tanto juntos e ele já foi pai em tantos momentos, que não há como deixar a raiva aumentar. Ele é um senhor de suas dores, incompreendido em meio de mulheres que não o ouvem, pois ele nunca tentou falar enquanto elas carregavam o fardo de seu silêncio. Mas você, você fala e fala demasiado. Você eu escolhi, em você acreditei e depositei expectativas e confiança, deixei meus pais acreditando que sua parceria iria somar, mas me vejo cada vez mais necessitando de muletas para me apoiar. Meus passos são pesados e manco, pois carrego um peso maior do que consigo aguentar. Meus ombros doem, minha coluna não me suporta e meus ventres choram os mal tratos. Me olho no espelho e não me reconheço para além de minhas frustrações, e das olheiras que denotam sofrimento e me dão mais idade do que tenho. Não consigo te perdoar, não somente por quando me negou ajuda, mas por não notar que ainda preciso e ignorar e mentir, todos os dias, dizendo que posso contar contigo. Diz não me entender, diz me amar, diz que tudo vai ficar bem e em apenas em momento de suplício tenta mostrar preocupação. Mas, ora, se tudo evidencia que você não se preocupa com nada além dos seus próprios desejos. Por que devo acreditar? Como vou voltar a confiar? Não fui contaminada, mas me sinto vítima da doença e, a cada dia, adoeço mais. Choro lembrando do porquê parei de acreditar em deus - e não foi quando me assumi ateia há poucos anos, foi uma soma de quando todas as vezes chorei e nunca fui ouvida. Todas as noites que passei em claro pedindo por compaixão, todas as vezes que sofri com o trabalho e tentei acreditar que não estava destinada a só trabalhar exaustivamente a minha vida inteira. Todas as vezes que pedi para cuidar de minha família, das doenças e do mal chamado estresse que sempre existiu entre nós. Nunca fui atendida. E hoje me lembrei de quantas vezes já chorei desesperadamente procurando uma luz ou uma trégua. E o que ganhei foi a tua incompreensão, me joguei no chão e meu ovário começou a arder num súbito continuo mal que atravessa meu corpo fazendo minha lombar queimar como se fosse para me lembrar de que sou humana. E que como sempre na minha vida, a felicidade é tão sublime e breve que é incapaz de me fazer acreditar que bons momentos podem perdurar. Tudo é passageiro, assim como os motivos para sorrir e amar. E tudo o que é ruim fica e dura tempo demais e suficiente para me fazer acreditar que não tem mais jeito.

domingo, 19 de abril de 2020

Eu, frágil eu

Faz um ano que parei de escrever aqui. Não sei dizer porquê exatamente, mas posso chutar. Talvez porque achava que meus delírios estavam tomando outras formas, que estava direcionando-os para algo mais assertivo. Mas é um fato que, relendo alguns posts, muita coisa não mudou. Talvez, certas mudaram para a pior. Não me reconheço mais. Não sei também ao certo o porquê disso, mas sinto que me perdi de mim mesma. Seja pela rotina que foi ficando cada vez mais difícil, seja pelos machucados que continuam latejando. Seja porque me sinto muito distante do ideal emocional que criei como subterfúgio e algo a se conquistar quando me sentia mal e precisava me ancorar. Mas, a verdade é minha navegação atracou em ares estranhos após tempestades que quase me naufragaram. Quando se é mais jovem, é mais fácil comemorar a sobrevivência, como um sinal de vitória acompanhado de frases de resiliência, tipo "nada me derruba", "eu aguento", e por aí vai. Quando se está numa fase da vida em que se busca estabilidade constante, a sobrevivência é só mais um dia do calendário. E fica cada vez mais nítido que não, não aguento mais.
Somos hoje completos estranhos, tão perto, mas tão distantes. Cada um se comunicando em línguas que não se conversam, como dois surdos, ou cegos, ou mudos. Confesso que às vezes não sei como ainda estou em pé, se até meu corpo denota minha exaustão. E não há qualquer sentimento de orgulho relacionado a esta confissão. Já que sinto que a qualquer momento vou adoecer, como uma sombra que paira sob um lago já sem peixes trazendo à tona o presságio da escuridão. Gosto de pensar que algo muito simples, como assistir Vikings, estava me dando alguma inspiração. Mesmo sabendo que minha sugestão poderia não agradá-lo, afinal, como se identificar com esses brancos safados que queriam colonizar o mundo? Apesar de que outros brancos safados colonizaram o mundo e assim que o mundo é, uma grande briga por quem coloniza mais enquanto outros morrem de fome. Ao começar a ver a série notei algo interessante nesses vikings, que é a ausência do medo perante à morte. Enquanto fomos criados num mundo de tradição cristão, em que o temer é constante, seja de deus ou do homem, é realmente acalantador. Gostaria de encarar este momento que todos vivemos dessa forma, mas a real é que temo, temo muito a doença e a morte, especialmente daqueles que jurei cuidar. E você, é um deles. Tenho falhado, talvez, nunca tenha cuidado de verdade, como você mesmo disse. Mas, lembro bem, de vários momentos que você nunca deixou ser cuidado de fato. E que é muito difícil cuidar de alguém que não valoriza isso. Fiquei relapsa, amargurada, como você mesmo disse. Fiquei o pior que eu mesma poderia me imaginar. Eu tendo a me culpar por isso, como se fosse um carma que carrego de saber que nunca vou ser amada, mesmo você me dizendo o contrário. E diz que o culpo. Fico pensando que não somos tão diferentes do cristãos tementes e hipócritas, seja do século VII, seja de agora. Confesso que tenho te tratado de uma forma que eu jamais gostaria de ser tratada, mas ainda assim, sou eu tentando me defender. Porque sinto que isso é uma constante, que se eu não me defender, vou cair de vez e vou me tornar de vez algo que nunca desejei e me nego de todas as formas possíveis a aderir: a submissão. Pra você pode ser exagero, histeria, afinal, já se perguntou quantas vezes você chamou ou consentiu uma mulher de histérica? Será que minhas inseguranças não têm um fruto real a não ser o mundo imaginário e perdido da minha mente? Será que minhas reclamações são tão distantes da realidade assim? Será que eu não mereço ser bem cuidada e que assim também vou voltar a cuidar? São tantas questões que não cabem mais aqui.
Tenho uma ferida na minha mão, que está ardendo e sensível ao toque. Sinto meu coração da mesma forma. E assim como qualquer aproximação faz a ferida doer e repelir o que lhe é estranho, sinto que meu condicionamento é este. Não posso dar o braço a torcer, porque você vai fazer de novo. E não há nada neste mundo, nenhum cosmético ou medicamento, que vai limpar sua visão. Assim como tendo a desconfiar, você tende a me desacreditar. E não há mundo possível para dois humanos assim viverem em conjunto.
Penso que o que une as pessoas é o sentimento de coletividade e de reciprocidade, e isso envolve diálogo, sincero e aberto, envolve querer fazer as coisas fluírem. Envolve se doar. E sinto que perdemos, ou talvez nunca tivemos concretamente por muito tempo, isso. Nossos sonhos se desencontraram, nossos abraços perderam o efeito reparador, porque a fala verborrágica, contraditória e errática soa mais alta. Os sorrisos selaram-se em amargor de lábios rachados. A voz nem soa mais como próxima à música. Assim como nossos corpos permanecem frios e nossas vontades desconexas. Tento entender onde errei e vou continuar tentando, não sob a exaustiva tentativa de racionalizar tudo, mas sob o espectro de que preciso melhorar. Mas não vou, nunca mais, ficar me culpando por um fim inevitável e cravado por duas pessoas.
É preciso saber a hora de ir embora, ainda mais quando a hora de se calar paralisou os ponteiros. Não acredito num futuro promissor para nós. Não posso me iludir mais, porque preciso ter os pés nos chãos e focar na luta diária que me é imposta. Gostaria que fosse diferente, mas ai eu estaria me iludindo novamente. A realidade agora é dura, feia, isoladora e as chances de liberdade parecem distantes. Mas, isso tudo me faz pensar no que é liberdade? Mais vale estar confinado num lar repleto de amor ou solto nas ruas esvaziadas pelas nossas escolhas de vida?
Me sinto pequena e sozinha. E se meu barco precisa navegar, que seja para ilhas mais afáveis ou para permanecer e criar raízes. Com você, ou não.