quarta-feira, 13 de maio de 2020

Não vamos sobreviver a esta pandemia

Por muito tempo reclamei da sensação de abandono sabendo que não se tratava apenas de algo que eu sentia involuntariamente. Pois sabia que sua falta de tato jamais seria resolvida com uma massagem de 5 minutos sobre a ferida já aberta. Hoje, um ano, quase dois anos depois, volto a sentir com mais intensidade as marcas sangrarem. Assim como o sentimento de infelicidade se renovou. Te odeio. Por me fazer lembrar do que meu pai já causou em minha mãe. Por ver você reproduzindo comportamentos muito parecidos, mesmo sendo de gerações diferentes, tendo vidas diferentes. Mas meu pai não consigo odiar, pelo menos não sem o sentimento de culpa acompanhado. Ele é meu pai e não o escolhi, mas já vivemos tanto juntos e ele já foi pai em tantos momentos, que não há como deixar a raiva aumentar. Ele é um senhor de suas dores, incompreendido em meio de mulheres que não o ouvem, pois ele nunca tentou falar enquanto elas carregavam o fardo de seu silêncio. Mas você, você fala e fala demasiado. Você eu escolhi, em você acreditei e depositei expectativas e confiança, deixei meus pais acreditando que sua parceria iria somar, mas me vejo cada vez mais necessitando de muletas para me apoiar. Meus passos são pesados e manco, pois carrego um peso maior do que consigo aguentar. Meus ombros doem, minha coluna não me suporta e meus ventres choram os mal tratos. Me olho no espelho e não me reconheço para além de minhas frustrações, e das olheiras que denotam sofrimento e me dão mais idade do que tenho. Não consigo te perdoar, não somente por quando me negou ajuda, mas por não notar que ainda preciso e ignorar e mentir, todos os dias, dizendo que posso contar contigo. Diz não me entender, diz me amar, diz que tudo vai ficar bem e em apenas em momento de suplício tenta mostrar preocupação. Mas, ora, se tudo evidencia que você não se preocupa com nada além dos seus próprios desejos. Por que devo acreditar? Como vou voltar a confiar? Não fui contaminada, mas me sinto vítima da doença e, a cada dia, adoeço mais. Choro lembrando do porquê parei de acreditar em deus - e não foi quando me assumi ateia há poucos anos, foi uma soma de quando todas as vezes chorei e nunca fui ouvida. Todas as noites que passei em claro pedindo por compaixão, todas as vezes que sofri com o trabalho e tentei acreditar que não estava destinada a só trabalhar exaustivamente a minha vida inteira. Todas as vezes que pedi para cuidar de minha família, das doenças e do mal chamado estresse que sempre existiu entre nós. Nunca fui atendida. E hoje me lembrei de quantas vezes já chorei desesperadamente procurando uma luz ou uma trégua. E o que ganhei foi a tua incompreensão, me joguei no chão e meu ovário começou a arder num súbito continuo mal que atravessa meu corpo fazendo minha lombar queimar como se fosse para me lembrar de que sou humana. E que como sempre na minha vida, a felicidade é tão sublime e breve que é incapaz de me fazer acreditar que bons momentos podem perdurar. Tudo é passageiro, assim como os motivos para sorrir e amar. E tudo o que é ruim fica e dura tempo demais e suficiente para me fazer acreditar que não tem mais jeito.

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