quinta-feira, 10 de março de 2016

Carol Peletier, férias e feminismo

Algumas semanas depois do carnaval, percebi que precisava descansar. A fadiga me subia pelas pernas e era conduzida por cada artéria, penetrando em cada poro até totalizar meu corpo, deixando-o completamente pesado. Percebi que minha ansiedade também estava às alturas e que desacelerar era mais que preciso. Chorei por duas semanas seguidas, todos os dias, ao me levantar para (não querer) ir trabalhar. Foi uma lástima nunca vivenciada.

É final de fevereiro, tive recesso no começo do ano e folga no carnaval, mas por que merda estou assim? Não sei. Até sei. Mas aqui, vou me abster em declarar apenas que meu corpo e minha mente pediram socorro - e minha mãe, que me disse que eu estava deprimida. Sofrimentos à parte, finalmente os dez esperados dias de fazer porra nenhuma férias chegaram. Embarquei numa maratona de descanso, muito sono, comidas deliciosas e frescas, muita arrumação (e desarrumação) no lar, momentos gostosos e de preguiça ao lado de momô, idas e vindas ao mercado e à casa de mamãe, papai e sistra, alguns momentos ao lado de amigos, e também muitos filmes e séries. E, claro, muito silêncio, ainda bem. Em um desses dias, entediada, resolvi que era a hora de colocar The Walking Dead em dia. Parei na terceira temporada faz mais de um ano, por preguiça e também porque não aguentava mais os assustadores pesadelos com zumbis que tive nesse tempo.

Sim, sou uma pessoa que se impressiona fácil com algumas coisas e as injeta, letalmente, em seu subconsciente, saciando-o por completo. Devo dizer que fiquei impressionada com a série, não sei se era o tédio ou a emoção provocada pelas cenas de ação, mas tenho alguns motivos além: personagens evoluindo entre conversas profundas sobre questionamentos existenciais. Que delícia! Mas, cito a série aqui principalmente por outra razão: a personagem Carol e meu antigo ódio por ela.

Detestava sua submissão ao marido e não dei qualquer mérito por ela tê-lo enfrentado antes de sua morte. No entanto, meu ódio era por ela inteira, tanto fisicamente, quanto pelas suas atitudes e, principalmente, por seu flerte com Daryl, meu personagem favorito quando comecei a ver a série (há quase três anos, acho). Achava ridículo ela investir nele, mesmo ela sendo uma mulher livre (até demais, tadinha, pois também perdeu a filha), e acredito que sentia tudo isso muito mais por ela ser velha, do que por ciúmes, ou coisa do tipo. Eu achava que Daryl deveria ficar com uma mulher mais bonita e que tivesse uma idade próxima, pois acreditava que isso seria mais aceitável, apesar de que não gostaria de vê-lo com qualquer outra pessoa. Sim, rolou um fanatismo adolescente na época, acontece.

Devo dizer que para se entender melhor esta confissão, é preciso levar em conta meu ser naquela fase. Estava afastada no feminismo, havia acabado de sair de um relacionamento abusivo (ou ainda estava nele, não lembro) e tinha perdido, naquele ano, cerca de 20 quilos. 13, fazendo reeducação alimentar e exercícios, e mais 6 só de estresse. Não sei explicar tudo isso, só sei que aconteceu. Por isso, era muito fácil para mim odiar a Carol, uma mulher forte, empoderada e firme em suas convicções e desejos, mesmo passando por vários lutos, vivendo durante o apocalipse zumbi (é) e sendo totalmente fora do padrão ideal de heroína que estamos acostumados: novinha, gostosa, de cabelos compridos e lisos, sedutora.

Era uma época em que eu tinha muitos medos e surfava pela vida como quem só leva caldo na cabeça, mas continua boiando. Certeza que seria a primeira personagem a morrer na série (a não ser que fosse necessário cumprir cota de asiáticos e eu fosse uma espécie de Michonne+Psylocke). Confirmava com exatidão uma frase da Kelly Osbourne, em que ela disse que uma ex-gorda nunca se sentirá magra. De fato, eu estava no meu peso "ideal", mas parecia magra, porque emagreci muito rápido. Estava flácida, cansada e triste. Foi um momento difícil.

Mas ok, superei, cresci e evolui (acredito e espero). E hoje, com meus olhos treinados e despida de pré-conceitos, pude ver uma Carol de um jeito que não esperava. A admirei e torci por ela, chorei com ela em algumas cenas e me questionei, uma porrada de vezes: como eu odiava essa mulher? E, outra dúvida gritante: por que o Daryl não ficou com ela? Ela é sábia, poderosa e amadureceu de um jeito brutal. De mulher frágil que apanhava do marido, ela se tornou uma das cabeças e braços mais inteligentes e fortes do núcleo, tomou decisões difíceis, mas sobreviveu e ajudou outros a sobreviverem. Como fui estúpida, preconceituosa e babaca, pensei. E, na verdade, notei que ela não precisa do Daryl, assim como nunca precisou de qualquer homem. Ela mostrou isso, mais do que uma, duas ou três vezes. Que mulher foda!

Pois bem, meu último dia de férias termina com uma nova tentativa de reeducação alimentar e com o objetivo de começar na academia semana que vem. Não por desespero e necessidade de atingir um padrão impossível e desnecessário, mas porque sinto que meu corpo pede novamente por cuidados, afim de evitar mais carga estressante, mais dias de "como estou horrorosa" e para que eu possa me amar ainda mais. E também com algumas lágrimas, porque estou de tpm e tudo me emociona, além de um flan de chocolate light que me espera na sobremesa. :) Também comecei um laboratório de roteiro para webdocumentário em um coletivo feminista. Sim, vai sair vídeo feminista logo menos. Sim, vai ter meu dedo no meio e meu nome nos créditos! :D

Mas, antes que eu me esqueça: me desculpa Carol, por ter sido injusta com você, com sua luta, que é muito mais importante que sua aparência, que é linda, por sinal. Me perdoe pelos pensamentos provenientes de senso comum e cruéis que tive de e por você. Perdoe a minha ignorância, minha desonestidade, minha falta de sororidade, de empatia e até de humanidade.Vida longa à Carol Peletier, minha nova heroína! Abaixo, a foto das minhas personagens favoritas:


E essa é a sobremesa que me gabei acima. Dica: cuidado com o que você faz no micro-ondas, afinal, panela velha é que faz comida boa! 

Bem, dias de preguiça, dias de glória! Agora, voltamos aos trabalhos!